28 agosto, 2013

"Não dá." - (Reflexões sobre o Programa Mais Médicos)

“Ter mentido é ter sofrido. 0 hipócrita é um paciente na dupla acepção da palavra; calcula um triunfo e sofre um suplício. A premeditação indefinida de uma ação ruim, acompanhada por doses de austeridade, a infâmia interior temperada de excelente reputação, enganar continuadamente, não ser jamais quem é, fazer ilusão, é uma fadiga.”

Victor Hugo, in "Os Trabalhadores do Mar"




Eu também acho uma vergonha a hostilidade aos médicos cubanos. Não pelas vaias, pois há legitimidade numa boa vaia e todo mundo sabe disso. Não sejamos hipócritas. Quem se envergonha pelas vaias deve, por uma questão de coerência, envergonhar-se de outras manifestações. Qual é a diferença? Como criticar as vaias e aplaudir as “vozes das ruas"? Muitos aplaudem, inclusive, o movimento Black bloc e até os vândalos. Estes estão representando grupos insatisfeitos, ou não? E os médicos brasileiros? Representam uma classe, um grupo, ou não? Será que todos eles são lixo e, por isso, não têm direito a criticar e questionar a vinda de seus colegas ao Brasil? Será que os médicos brasileiros, em especial os que trabalham no setor público, não têm queixas e mágoas pela completa desvalorização de sua carreira ao longo dos últimos anos? Será mesmo? No fundo, sabemos que têm... Entretanto, o que eu e toda gente de bom senso e o mínimo de humanidade acha bastante vergonhoso, são as atitudes preconceituosas que estão implícitas nessas vaias. Já li coisas terríveis sobre a questão - inclusive que as vais e etc. foram "plantadas" pelo próprio PT, mas vou desconsiderar - é ardiloso demais... Sim, mata de vergonha. Faço coro com os que lhes desejam boas-vindas. Em nenhum momento desqualifiquei os médicos estrangeiros. Entretanto, preciso dizer que para mim é vergonhoso também, o governo esperar tanto para trazê-los como forma de minimizar o sofrimento das pessoas extremamente necessitadas e que, de fato,  não estão nem aí se o médico é “gringo” ou não. Mas por que só agora? Por que às vésperas das eleições? Isto é uma vergonha, sim! É o "X" da questão. É uma vergonha deixar o povo à mercê dos hospitais públicos sucateados, sem material hospitalar - que vai da gase, à maca, aos leitos -, lotados e, dos planos de saúde, caríssimos e pagos, pela maioria, com o dinheirinho contado - por medo do que é público. É uma vergonha deixar esse povo que vive tão distante, sem nada nem ninguém que os ajude por tanto tempo... – insisto. Se é sabido que houve sucesso antes (houve?) – antes mesmo do governo petista,  lá pelos idos de noventa –, por que demorar tanto para retomar o projeto – ainda que lhe dando outro nome, para colher os louros? Sim, é uma vergonha. Não vou entrar no mérito jurídico, pois desconheço a questão e, se for contra a lei, se for exploração é vergonhoso demais também. Vergonhoso e sério! Por que criticar ações fora da lei “lá” (nos outros partidos e partidos que ainda estaõ tentando existir) e acolher “cá” (situação e aliados)? Mas a questão é maior. É, ou deveria ser, profundamente ética, política e complexa...  Mas, política séria à parte, é como guardar um presente para entregá-lo perto do próprio aniversário, lembrando sutilmente: quero ganhar também. Ou, como dar um pedaço de bolo num prato bem bonito ao vizinho esperando que volte cheio. Ou ainda, entregar uma "bota" e daqui a quatro anos entregar a outra... Resumindo: pura politicagem, campanha! Desculpem-me, mas não consigo dissociar essa vinda dos médicos estrangeiros da questão das manifestações de junho e da proximidade das eleições de 2014. Desculpem-me, posso estar em muitos aspectos mal informada, não é? Mas não ando pelos gabinetes de Brasília - nem em quaisquer outros. Não sou cientista polítca nem jornalista; mas... como dizem: “não dá”. Enquanto "reles" eleitora, confio bastante em minha capacidade de observação e intuição. A política deixa rastros...


Tania Anjos