I - Justificativa pedagógica
Todo processo científico deve começar com uma indagação. Do mesmo modo, todo processo pedagógico deve começar com uma pergunta: por que ensinar determinada coisa? Assim, quando se vai ensinar literatura, deve-se perguntar: porque ensinar literatura no ensino médio? São os objetivos.
O ensino da literatura deve ser defendido por vários motivos pedagógicos: 1. Pelo lado informativo – deve-se ensinar literatura para que nosso aluno saiba e consiga transmitir conhecimento. Além do conteúdo que o texto literário contém, o estudante recebe outras informações, ou seja, o texto literário é forma de conhecimento; 2. Pelo lado formativo, Nelly Novaes Coelho, afirma: “literatura é reflexo da vida, é a exteriorização verbal artística de uma experiência humana, é evidente que usaremos dela para orientar a educação integral de nossos alunos” (COELHO, Nelly Novaes. O ensino da literatura, 1966, p. 8.). É comumente aceito que a literatura pode levar o aluno à sua formação humanística e assim à educação integral; 3. Com aprimoramento da leitura pelo contínuo contato com a literatura. Em conseqüência, melhorará também a sua escrita. Com isso, adquire o seu próprio estilo, modo peculiar de escrever e de comunicar-se pela linguagem.
Finalmente, como a literatura é cultura, o texto literário irá despertar esse gosto pelo conhecimento, pelo senso crítico. O aluno, assim, poderá saber distinguir um bom texto de um texto de menor valor, é a formação do leitor.
II - Justificativa do ensino por meio de textos
O ensino da literatura deve iniciar-se por textos mais leves, como as crônicas de Fernando Luiz Veríssimo, bastante adequados. Mais tarde, pode-se introduzir o estudo de autores tradicionais da literatura brasileira, como aqueles do Romantismo, que são relativamente fáceis, embora de uma outra época, o que às vezes não agrada muito ao aluno. Ao final do estudo da literatura, é que se pode começar com textos, mais complexos, como os de Guimarães Rosa e os de Clarice Lispector.
Simultaneamente aos textos em prosa, devem-se inserir os textos poéticos acessíveis, como os de Mário Quintana e os Manuel Bandeira. Cecília Meireles, Adélia Prado e outros autores mais complexos, como Carlos Drummond de Andrade, ficariam para mais tarde, ao final do ensino médio.
Pedagogicamente, seria bom que a escolha do texto a ser estudado fosse de escolha do professor em conjunto com o aluno, ou, então, do próprio aluno. Assim, ele se sentiria motivado para a leitura, compreensão e análise do texto.
III - Justificativa histórico-literária
Em sala de aula, o texto literário deve ser colocado em seu contexto: época de sua produção, autor que o produziu, a forma literária em que está escrito e outros relacionamentos que o próprio texto sugerir. Assim, um conto de Mário de Andrade deve vir acompanhado da explicação do professor sobre o contexto histórico: séc. XX, período após a Primeira Grande Guerra; o contexto literário: a Semana de Arte Moderna, de 1922; o papel de Mário de Andrade na organização e realização da Semana, ao lado de outros como Oswald de Andrade.
Do ponto de vista da Teoria da Literatura, o conto, como forma literária, deve ser visto como pertencente à ficção. Uma espécie de texto que é inventada, criada, e que, por isso, não deve corresponder exatamente à realidade.
O texto ficcional, como a própria palavra assinala, é ficção, é invenção, é fingimento. Assim, não tem compromisso com o real, com a verdade. Terry Eagleton ao definir literatura, afirma: “É possível, por exemplo, defini-la como a escrita ‘imaginativa’, no sentido de ficção – escrita esta que não é literalmente verídica” (EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma introdução, s. d., p. 1).
Do mesmo modo, em textos dos anos 40, como os de Jorge Amado, há que se considerar o período do pós-guerra, quando o mundo todo entrou em colapso e surgiram ou se intensificaram vários movimentos filosóficos, como o Socialismo. Tudo isso serviu de base para uma literatura política e de alcance sociológico. Assim foram também os textos dos autores do Romance do Nordeste, como os de Graciliano Ramos e os de Rachel de Queiroz.
Do mesmo modo, devem-se enfocar textos da atualidade literária. Um texto de Clarice Lispector só pode ser compreendido após o Existencialismo de Jean-Paul Sartre, por exemplo. Um texto de Guimarães Rosa, com sua linguagem criativa e renovadora, só pode ser entendido após as várias formas de Experimentalismo na literatura.
Antonio Candido, sobre a relação entre história e literatura, declara que os textos históricos: “se não ajudam a penetrar no miúdo da análise, talvez ajudem a entender alguns traços gerais do poema, como o gosto pelos contrastes e a energia da descrição...” (CANDIDO, Antonio. Na sala de aula: caderno de análise literária, 1986, p. 9). O mesmo acontece diante de outras relações, como aquela entre filosofia e literatura, por exemplo.
Quanto ao texto poético, há também que se explicar ao estudante como esse tipo de texto funciona: em versos ou não; com rima ou não; com ritmo próprio; e com as palavras que se transfiguram. Massaud Moisés ensina: “A poesia é a linguagem no seu ser genuíno” (MOISÉS, Massaud. A criação poética, 1977, p. 27). O poema, deve ainda merecer explicação da sua forma: forma fixa; soneto; construção mais livre, como é mais comum no Modernismo.
IV - Justificativa metodológica: o ensino com pesquisa
Uma última finalidade para o ensino da literatura no ensino médio é introduzir o aluno à iniciação da pesquisa. O aluno deve aprender a pesquisar textos literários, observar aqueles que mais chamam a sua atenção, fazer análises de alguns textos e também desenvolver-se em apresentações.
Esta metodologia pedagógica vem sendo amplamente defendida e difundida no ensino brasileiro por Pedro Demo. Com ela, o aluno passaria de mero espectador no processo de ensino e de aprendizagem e assumiria papel de agente no seu próprio aprender. (DEMO, Pedro. Pesquisa e construção do conhecimento, 2002, p. 10).
O professor, por seu lado, deve dar a oportunidade ao aluno de mostrar o resultado de suas pesquisas, proporcionando-lhe tempo em sala de aula ou em evento paralelo, como Seminários e outros. Assim, facilita-se ao aluno e abrem-se para ele novas oportunidades.
V - Palavras finais
O magistério é a profissão daqueles que realmente querem ver o aluno desenvolvendo-se com base sólida para futuros estudos, vestibulares, concursos. O verdadeiro professor é aquele que procura fazer que o seu aluno progrida cultural e profissionalmente. Assim, a escola e os professores estarão cumprindo o dever de formar cidadãos conscientes, para a realização pessoal.
REFERÊNCIAS
CANDIDO, Antonio. Na sala de aula: caderno de análise literária. São Paulo: Ática, 1986.
COELHO, Nelly Novaes. O ensino da literatura. São Paulo: FTD, 1966.
DEMO, Pedro. Pesquisa e construção do conhecimento: metodologia científica no caminho de Habermas. 5. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002.
EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma introdução. Trad. Brasileira Waltensir Dutra. São Paulo: Martins Fontes, s.d.
MOISÉS, Massaud. A criação poética. 16 ed. São Paulo: Melhoramentos; Universidade de São Paulo, 1977.
3 comentários:
Prof. Jayme, olá!
Muito bom o tema do post que pontua a fundamental questão do porquê dos conteúdos propostos, entre outras questões.
O ensino médio precisa fazer jus ao nome e mediar, de fato, as questões.
Saber da importância de se aprender literatura é sem dúvida algo que pode motivar os alunos, principalmente se estes tiverem participação na escolha do livros a serem lidos.
Achei muito importante o sr. trazer a questão de se "linkar" os assuntos, levando-os a outros temas e contextualizando-os no tempo e espaço.
Obrigada, professor.
Forte abraço.
Taninha,
Obrigado pelo comentário em nosso na realidade seu) blog.
Vou aguardar um tempo. Quando achar que é o momento, faço outra postagem.
Um grande abraço,
Jayme
Prof. Jayme,
só tenho a agradecer pelos seus posts em nosso blog. São fartos de informações preciosas - principalmente para professores, vestibulandos e alunos de Letras.
Abraço carinhoso. Estaremos aguardando! Sei que seu tempo é precioso.
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