10 agosto, 2009

Educação: ainda uma utopia?


Apesar dos meus poucos anos de magistério, tenho sentido nesta área de atuação uma grande falta de experiência, inteligência e, principalmente, bom senso nos programas educacionais voltados para jovens e adultos no Brasil.

Não quero citar nomes, mas atuo como professora em um programa do Governo Federal voltado para jovens entre 18 e 29 anos que não concluíram o Ensino Fundamental, e me decepciono ao perceber nele tantas incongruências.

A idéia do programa é belíssima: oferecer uma formação básica inclusiva e de qualidade a jovens e adultos das periferias brasileiras (que não concluíram o Ensino Fundamental) dentro dos preceitos da ética e da cidadania, oferecendo uma ajuda de custo no valor de R$100,00 para evitar a evasão escolar e, de quebra, prepará-los para o mercado de trabalho, incluindo na grade curricular cursos específicos de qualificação profissional.
Pois é, tudo isso seria muito bacana se não houvesse tanto interesse político e inverdades quanto ao aprendizado destes alunos. O primeiro critério para que participem (como alunos) de um programa como este é que todos sejam alfabetizados. Não o são. Com isso, fica muito difícil o professor conseguir manter o nível da aula e dos alunos em perfeita harmonia, o que só contribui, dentre outras coisas, para o aumento do analfabetismo funcional. O governo pensa em quantidade; não pensa em qualidade. As salas de aula são superlotadas, o espaço físico das escolas não é bom, não há cuidadores (pessoas que possam cuidar dos filhos das alunas que já são mães que, por não terem com quem os deixar, os levam para a escola), o material didático adotado deixa muito a desejar e o professor fica em um beco sem saída quando percebe que, no fundo, o interesse de muitos alunos não é o conhecimento a ser adquirido com as aulas do Programa (o que pode vir a melhorar seu nível de vida), mas sim a “bolsa-esmola”, ou melhor, a “bolsa-escola” de R$100,00. Já cheguei a ouvir de alunos que é muito melhor receber bolsa-escola, bolsa-família, bolsa-isto, bolsa-aquilo do que arranjar um emprego. Isso é preocupante. O Brasil parece que vem formando, há algum tempo, uma legião de esmolantes. Pessoas que se acomodam com essas pequenas “ajudas” do governo que, claro, ajudam; mas não mudam. Percebemos um nível muito baixo em nossos alunos, mas os dados estatísticos divulgados pelo MEC são sempre muito satisfatórios. Sei que isso não acontece somente nos programas, mas também nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, tanto municipais como estaduais. Quando tudo isso irá mudar?

Não quero formar analfabetos funcionais. Quero formar homens e mulheres capazes de Ler e interpretar textos, capazes de viver e interpretar a vida. Uma juventude que não tenha medo da concorrência, nem de se expressar livremente. Que não aceite tudo de forma passiva, que se sinta capaz de enfrentar seleções de empregos, concursos e tenha mérito suficiente para chegar à universidade e conquistar seu espaço social. Não quero pessoas que parem por aqui. Quero vê-las seguir a estrada adiante, construir sua própria trajetória e tomar o controle da direção, sem medo do caminho.

Isso ainda me parece uma utopia. No entanto, nós educadores, não desistiremos. A educação ainda será prioridade no Brasil. Chegará o dia em que não mais precisaremos nos envergonhar.

Mas enquanto isso, no Senado Federal...

6 comentários:

Tania Anjos disse...

Oi, Marcinha!

Seu texto de aparente simplicidade toca em pontos nevrálgicos do ensino público aqui no Brasil.

Eu entendo perfeitamente o que você coloca. E, na minha opinião, repito o seguinte: o Brasil precisa gastar dinheiro com a Educação. Investir pesado. Do contrário, só teremos mais e mais indignação dos profissionais conscientes de sua importância e, absolutamente perdidos, sem saber o que fazer para dar conta de seu trabalho...

Eu acho que esses programas de bolsa isso e aquilo só geram dependência e "certo" relaxamento por parte de todos; governo e povo.

Veja, por mais que se inventem programas, a alfabetização é sempre o grande nó da educação. Sempre! Nada dá conta e haja projetos para correr atrás desse prejuízo que começa já na pré-escola, quando o professor não compreende a importância e o papel da linguagem [falada, escrita, cantada, contada e verso e prosa, matemática, plástica, corporal, musical, teatral ...enfim...]na formação das crianças, por exemplo...
Então, Marcinha, perde-se um tempo precioso e sem volta.Quando essa criança entra no Ensino Fundamental - aos seis anos - ela chega cheia de lacunas não preenchidas e o processo de alfabetização se arrasta e se arrasta... às vezes, por todo o Fundamental - até porque ano após ano o professor tem mais e mais dificuldades de trabalhar essas linguagens dando conta do planejamento, currículo... É aí que a 'coisa" desanda. Mas de quem é a culpa? Não creio que seja do professor não! Quantos alunos ele tem na sala de aula? Quantas dificuldades na área da fala, questões psicológicas das crianças [de origem social, familiar...], questões na área neurológica e por aí vai. Então o professor, fica muito limitado mediante a infra-estrutura absolutamente precária em função de tantos pormenores que dificultam o processo. Tem também, o seu despreparo! Culpa dele? Claro que não!

A questão é super complexa e ultrapassa os muros da escola, sim.
Só que na sala de aula - como você bem ilustrou - o professor precisa dar conta. E, só Deus sabe o que ele faz para. Pode, inclusive, ficar doente exposto a tanto estresse...Mas será que estresse de professor é levado a sério? Pois é...

A sua pergunta ecoa: "Educação: ainda uma utopia?". Vamos ver se lá no Senado Federal, um dia, alguma Excelência possa responder.

Beijos, Marcinha!
Parabéns pelo post!


Taninha.

Ricardo e Regina Calmon disse...

Clap Clap Clap!!!!!!!!!
Belo post manifesto,por educadoras de ponta iniciando com dedicação missão linda essa!Sua geografia da alama e da cultura de nação essa nossa,contundente e visceral é!
Parabéns a Marcinha e Ocê Taninha!
Bzu mãos de ambas mestras da ternura e educação!
Viva a Cultura!

Viva a Vida!

Márcia de Oliveira disse...

Obrigada a todos!

Confesso que fiquei bastante apreensiva na hora de postar algo aqui, pois este blog só tem a colaboração de feras. Mas pensei muito, me acalmei e cheguei à conclusão de que a melhor maneira de escrever algo bom seria escrever com verdade e simplicidade. Postei o que sinto: minha indignação com a educação e política brasileiras. Este espaço criado pela Taninha (uma educadora e pessoa que admiro muito e agradeço demais pela confiança)abre um excelente espaço para discussões, o que já é um grande primeiro passo para as mudanças.

E viva a liberdade! E viva a coragem dos profissionais da educação! E viva todos que estão aqui!

Beijos.

Tania Anjos disse...

Viva!!!

Mais que legítima a sua indagação, Marcinha. Agradecida e super feliz com essa equipe, fico eu.

Bjs!

Ricardo Calmom,

mais uma vez - muito obrigada!

Abraço,
Taninha

Felipe Martins disse...

O problema da educação no Brasil é estrutural. Não se deve disfarças essa situação com progrmas que a primeira vista são bons, como esse citado por vc, mas no fundo são assistencialista. Só teremos uma educação de qualidade quando houver um profunda reforma educacional no Brasil. O que me desanima é quendo olhamos para o fundo do túneo não enxergamos uma luz...


dê uma passadinha no meu blog? ( www.fmartins07.blogspot.com )

KA disse...

Márcia,

A educação no Brasil realmente é precária. Você tem toda razão quando levanta sua voz de inconformismo contra essa situação. Isso tem que ter um fim. Mas como? Com mais investimentos, formação de educadores, nova política educacional. O pais tem que ter vontade política para começar a mudar essa situação. Li uma reportagem sobre a Coréia, onde essa mudança foi possível, porque não seria no Brasil?

Você tem razão,porque: "...Mas enquanto isso, no Senado Federal..."